sexta-feira, 17 de outubro de 2014

A Transmutação do Papel do Cidadão


A Democracia como a conhecemos pode ser facilmente resumida à uma competição entre Agremiações Esportivas. Essas Agremiações Esportivas, que alguns preferem chamar de Partidos Políticos, têm campeonatos bem definidos (1ª. e 2ª. Divisão) que ocorrem em ciclos de quatro anos. Essa camuflagem de identidade é particularmente evidente durante esses ciclos de competição, que denominamos período eleitoral.

É quase certo que a maioria dos cidadãos dessas ricas terras tupiniquins tem um time do coração e quer vê-lo chegar na final do campeonato. Nisso é onde reside a parte mais hedionda dessa camuflagem semântica, pois o campeonato e suas regras anacrônicas ajudam a mascarar a inépcia, e falta de vontade, desses Clubes Políticos em produzir um projeto transparente e verdadeiro de construção de uma “Sociedade mais justa e igualitária”. 

A própria expressão “Sociedade mais justa e igualitária” me coloca num estado de sobressalto, de inquietude, de incerteza e questionamento sobre a ambiguidade política de seu significado.

Percebam que quando alguém se diz "a favor da igualdade", isso não quer dizer quase nada! Não conheci um político até hoje que se colocasse abertamente contra o “fim da miséria”. Não conheci um político até hoje que se posicionasse contra “o fim da corrupção”. A verdade é que todo político tem no seu manual básico de campanha um cabedal de expressões politicamente corretas, que servem ao propósito de anestesiar a capacidade  investigativa dos cidadãos comuns (a bem da verdade, alguns esquecem o seu em casa). E obviamente, dependendo da estatura deste político ou do Clube que ele representa no campeonato, o mesmo terá um “marqueteiro” incansavelmente pesquisando e analisando a eficácia deste manual.

Em geral, nesses manuais, os políticos maliciosos (sei que isso é um pleonasmo) aprendem a doutrinar as mentes facilmente impressionáveis ​​com propostas meramente estéticas, transmutando os “cidadãos-eleitores” em “zumbis-torcedores” (uma versão mais sofisticada de Resident Evil, onde ao DNA do T-Virus foi incorporado baixa imunidade à mentira, embromação, ludibriação, pilantragem, malandragem, picaretagem, trambicagem, ...)

Resta dizer, que de minha longa observação, sempre que expressões com alta carga ideológica como "erradicação da miséria" ou "combate à corrupção", “geração de empregos”, “modernização do estado” for usada, durante esta fase do campeonato, para caracterizar um programa de governo (ou uma agenda ideológica), precisamos estar preparados para colocá-lo sob suspeita e investiga-lo mais profundamente: afinal, essas expressões fazem parte do kit básico fornecido por todos os Clubes a seus competidores.

Isso é fundamentalmente importante nessa fase da competição em que restam poucos “cidadãos-eleitores” que ainda não foram transmutados em “zumbi-torcedores”. Estamos na reta final do campeonato e os que já foram transmutados estão totalmente mobilizados na defesa de seus clubes.

Alguns acreditam no “Cruzeiro”, outros acreditam no “Internacional”... Também, tem alguns que estão órfãos de times e, por revolta ou falta de opções, não querem mais saber do campeonato e negam-se a aceitar a pecha de “zumbi-torcedores”.

Alguém deve estar se perguntando: “... E aí, e você? Você acha que esse seu discurso pedante e auto-indulgente é a garantia de que você está imune a essa transmutação?”

Não, em hipótese alguma! Infelizmente, apesar de ser um sobrevivente da epidemia de 1989, ainda não estou totalmente imune. O fato positivo é que estou agora um pouco mais resiliente aos efeitos do vírus e, assim, consigo aprender um pouco mais com algumas provocações intelectuais e políticas, que inevitavelmente surgem nessa fase mais sensível do campeonato.

Neste contexto, para reflexão, antes da final deste campeonato, deixo uma provocação intelectual, baseada no artigo do Prof. Antonio Ozai, intitulado “Ética na Política? Da sagrada ingenuidade dos céticos ao realismo maquiavélico”.

“(...) “

“...há quem pense que ética e política não se misturam. Quem pensa assim, adota uma postura que nega qualquer vínculo da política com a moral: os fins justificam os meios

“(...)”

Esta análise nos coloca diante de problemas concretos. Partindo do pressuposto que os fins buscados são diferentes, pode a direita e a esquerda utilizar os mesmos meios? Quem luta pela liberdade pode usar recursos ditatoriais, repressivos? Quem respeita a vida humana pode adotar procedimentos de tortura assassinatos etc., em nome do objetivo político? O que diferencia uma ditadura de esquerda de outra de direita? O terrorista que luta pela liberdade de seu país justifica os meios que utiliza e que, invariavelmente, vitima inocentes?

A todos desejo uma boa reflexão e um comportamento exemplar nesta final de campeonato!

_____________________________________________________
A Arte original da imagem usada nesta publicação é de autoria de Anthony Freda, produzida na campanha presidencial americana de 2012.

Nenhum comentário:

Postar um comentário